Tradutor

sábado, 22 de maio de 2010

Respostas sobre Reencarnação. Parte 1

Algum tempo atrás, navegando pela Internet, encontrei uma página ligada a uma igreja evangélica que fazia uma série de ataques ao Espiritismo, em todas as suas manifestações. Lendo alguns artigos, percebi que eles dedicavam especial atenção em atacar a doutrina da reencarnação. Não é por acaso: esse é um dos principais pilares das religiões de matriz espiritualista. Na mesma página havia um questionário tomado emprestado de uma organização católica, intitulado “20 Perguntas aos Reencarnacionistas”. Percebendo a inconsistência das perguntas, resolvi respondê-las, uma a uma. Como percebo que, em alguns momentos, nós, espíritas umbandistas, nos esquecemos um pouco desse fundamento, decidi publicar as perguntas e as respostas, até como forma de fomentar a reflexão sobre esse fundamento tão importante de nossa religião. Como o texto ficaria muito grande para ser publicado em um único artigo, irei dividi-lo em dez partes, com duas perguntas de cada vez.
PRIMEIRA PERGUNTA.
"Se a alma humana se reencarna para pagar os pecados cometidos numa vida anterior, deve-se considerar a vida como uma punição, e não um bem em si. Ora, se a vida fosse um castigo, ansiaríamos por deixá-la, visto que todo homem quer que seu castigo acabe logo. Ninguém quer ficar em castigo longamente. Entretanto, ninguém deseja, em sã consciência, deixar de viver. Logo, a vida não é um castigo. Pelo contrário, a vida humana é o maior bem natural que possuímos."
R- O cerne de toda a questão, na verdade, é conceitual. A resposta deve necessariamente principiar pelo dimensionamento do conceito de vida. Quando consideramos que vida é a do espírito – essa sim, maior bem natural que Deus nos concedeu – entendemos que a encarnação nada mais é que uma etapa do processo evolutivo, um momento efêmero na eternidade da vida espiritual. Assim entendida, a encarnação é espécie dentro do gênero vida O espírito vive, encarnado ou desencarnado e, por conseguinte, não existe morte, mas tão somente uma alternância entre dois estados de consciência viva.
Outro conceito que carece ser esclarecido é o de pecado: quando se parte de uma visão maniqueísta do mundo – como fazem as religiões cristãs tradicionais – concebe-se um homem angustiado e dividido entre a virtude e o pecado, como se o bem e o mal fossem autônomos, antagônicos e imutáveis e a opção por um deles conduzisse irreversivelmente à condenação ou à salvação. Quando, no entanto, se parte de uma visão dialética do mundo – como fazem os espíritas reencarnacionistas – percebe-se que a grande tensão existente no ser humano é a que se trava entre a ignorância e o conhecimento, os quais não são autônomos, mas conjunturais, na medida em que se transformam com o tempo; não são antagônicos, mas inversamente proporcionais, na medida em que, crescendo o estado de conhecimento, decresce o de ignorância, e, por fim, não são imutáveis, mas transitórios, na medida em que a ignorância cede lugar ao conhecimento e esse se aperfeiçoa infinitamente.
A conseqüência desse raciocínio é que não existe um pecado advindo de uma opção pelo mal, reclamando punição; existem erros advindos da ignorância, reclamando reparação e aprendizado. Dessarte, a encarnação não é vista pelos espíritas como um castigo, mas como uma nova oportunidade de crescimento, verdadeira expressão da misericórdia e da justiça divinas, oportunidade essa à qual nos agarramos como a uma tábua de salvação.
SEGUNDA PERGUNTA
"Se a alma se reencarna para pagar os pecados de uma vida anterior, dever-se-ia perguntar quando se iniciou esta série de reencarnações. Onde estava o homem quando pecou pela primeira vez? Tinha ele então corpo? Ou era puro espírito? Se tinha corpo, então já estava sendo castigado. Onde pecara antes? Só poderia ter pecado quando ainda era puro espírito. Como foi esse pecado? Era então o homem parte da divindade? Como poderia ter havido pecado em Deus? Se não era parte da divindade, o que era então o homem antes de ter corpo? Era anjo? Mas o anjo não é uma alma humana sem corpo. O anjo é um ser de natureza diversa da humana. Que era o espírito humano quando teria pecado essa primeira vez?"
R- A questão parte de uma assertiva que denota desconhecimento da doutrina da reencarnação nos moldes espíritas, pois que o Espiritismo em nenhum momento afirma que a alma só reencarna para pagar os pecados, até porque, como bem já se demonstrou anteriormente, o pecado não existe. O espírito reencarna com o fim de trilhar sua jornada evolutiva que começa na matéria densa e passa por diversos estágios que incluem matérias mais sutis em orbes distintos do terrestre, até se desvencilhar do envoltório perispiritual e poder habitar mundos perfeitos, onde passa a colaborar diretamente na infinita tarefa da criação divina.
Fato é que Deus cria o espírito simples e ignorante e faz com que ele inicie sua escalada para a perfeição num estágio primário, pelo mesmo motivo que não se matriculam crianças em universidades.
O que muitos insistem em não perceber é que a perfeição não é atributo do homem, é conquista. Uma conquista que se faz a passos lentos, mas gradativos, tendendo sempre ao infinito, já que infinita é a perfeição de Deus.
Esse raciocínio, aliás, é muito mais acorde com a grandeza divina, pois, se, como alguns pretendem, o homem fosse criado perfeito e depois pecasse, teríamos que forçosamente admitir que a perfeição não era tão perfeita assim.
Dessa sorte, ignorante e simples, o homem erra e, ao errar, contrai débitos que virão exigir reparação, na mesma ou em outra existência. Essa reparação, por sua vez, contribuirá para o desenvolvimento da consciência, que é o elo de nossa ligação com o criador. Essa consciência, embrionária na infância do espírito, nutre-se da experiência acumulada a cada existência e em seus intervalos, aproximando-se mais da fonte quanto mais se desenvolve.
Fica evidente que sendo falsa a premissa que introduz a pergunta, falsos são todos os raciocínios que dela derivam e que compõem o corpo da questão.
Ademais, existe até mesmo uma falha de construção lógica na formulação, já que à pergunta “Quando se iniciou esta série de reencarnações?”, só existe uma resposta possível: na segunda encarnação, pois a primeira não era “re”, era apenas encarnação. Quanto à questão da natureza humana ou angelical, não merece maiores considerações, já que somente a estreiteza de raciocínio consegue conceber uma criação hierarquizada. Quem concebe um Deus justo, concebe seres criados em condição de igualdade, diferenciando-se, com o tempo, unicamente pelo merecimento, pela expansão da consciência e pelo aprendizado. Aqueles que vislumbram um Deus tirânico e caprichoso, na verdade o criam, inspirados em sua própria natureza; para se justificarem, se possuem uma natureza igualmente tirânica, ou para se completarem, se possuem uma natureza subserviente e bajuladora.

0 comentários:

Postar um comentário