Embora
não pareça à primeira vista, Umbanda é uma religião de grande profundidade
filosófica. A evidente simplicidade de formas é o portal de entrada para um
mundo de conceitos que, bem compreendidos e bem aplicados, tendem a conduzir a
um estado de verdade e, consequentemente, de libertação, na exata medida da
previsão do mestre: “conhecereis a verdade e ela vos libertará.”
Por ser eminentemente conceitual,
sua prática e sua vivência demandam honestidade intelectual e precisão
interpretativa, porque os conceitos da Umbanda, estando conectados com o
Evangelho, carregam em si o germe do absoluto, não sendo passíveis, portanto,
de relativizações oportunistas nem de falseamentos estratégicos. Os caminhos
para a verdade podem ser múltiplos, mas não há atalhos; e essa verdade é uma
só, capaz de contemplar todas as
verdades individuais que a ela se adequarem, sem, contudo, negociar nem ceder
em nada àquelas que dela se afastem. Ante
tal esclarecimento, já é possível falarmos, então, de um conceito que ainda é
profundamente mal compreendido pelos adeptos e principalmente pelos aderentes à
Umbanda: o Universalismo.
Sim, a Umbanda é universalista. Mas
o que exatamente quer dizer isso?
Esse
conceito tem sido a fonte de grandes equívocos e mal entendidos, porque algumas
pessoas, seja por ignorância, seja por má-fé, entendem o universalismo a seu
modo e esse modo está quase sempre relacionado com um desejo de viabilizar no
plano religioso práticas e ideais totalmente dissociados dos pressupostos de
qualquer religião e, notoriamente, do Cristianismo. Essa tentativa normalmente
se dá por uma fórmula bastante simples em que o indivíduo entra com a ideia e a
Umbanda entra com a legitimação. Mas isso não é universalismo ou, se
preferirem, universalismo não é isso.
O verdadeiro sentido, o sentido cristão
e fraterno do universalismo consiste em acolher indistintamente a todos que
necessitem de amparo, auxílio, lenitivo, orientação... Indistintamente
significa não impor condições para acolher, não criar óbices para acolher e ter
como única motivação o desejo sincero de servir e amparar. Mais do que isso, a
Umbanda ainda oferece oportunidade de trabalho em suas fileiras a qualquer um
desses necessitados, ou a qualquer outro trabalhador que a ela se apresente demonstrando
o desejo de ajudar. E a esses, não lhes perguntar a procedência, e não lhes
impõe condições. Mas a Umbanda possui princípios próprios, crenças próprias,
ritos próprios e um código moral próprio e será sempre o acolhido que se
adequará aos princípios, às crenças e à moral da Umbanda, e não o contrário.
Se assim não fosse, dificilmente
teríamos uma religião e faríamos algo bem mais próximo de um espetáculo de
variedades em que Deus não passaria de um pano de fundo, um cenário bonito,
porém inerte, emprestando ares de normalidade e dignidade a um lamentável
cortejo de iniquidades de todo tipo. Infelizmente, algumas instituições cederam
a esse apelo (que é sempre muito forte, por sinal), mas isso não é Umbanda.
Construir uma umbanda cristã e
universalista é o grande desafio dos verdadeiros e autênticos umbandistas. E,
por falar em desafio, vale dizer que na Umbanda não fazemos desafios a Deus. Ao
invés disso propomos a nós mesmos o desafio de vencermos nossas torpezas; de
desgarrarmo-nos do lodo imundo e pegajoso de nossas paixões mesquinhas; de
emergirmos do pântano pútrido das perversões sórdidas que ainda animam nossas
pobres almas; de deixarmos de envergonhar nossa respeitável ancestralidade
símia e cruzarmos – nas palavras de Nietzsche – a ponte que separa o animal do
além do homem.
Certamente não é uma tarefa fácil, mas
temos certeza de que em todos os cantos do mundo, em todas as raças, etnias e
culturas existem indivíduos que estão dispostos a empreender esforços nesse
sentido e é por isso que somos universalistas. Quiçá consigamos ser sempre
fortes e determinados a fim de bem cumprirmos o vaticínio de levar ao mundo
inteiro a bandeira de Oxalá.
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